segunda-feira, 1 de dezembro de 2014

Colher do xarope

Já alguma vez disse uma palavra tantas vezes que no fim a palavra parece-lhe estranha? Experimente dizer alto: colher. Colher, colher, colher. Colher! Colher... colher!

É quando encontramos uma palavra "gasta". E infelizmente, se a repetição não for usada com moderação, pode gastar também ideias. Esperemos que não.

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Há Névoa na Cidade

Ao fim de um ano e pouco ainda estamos a tentar delimitar a fronteira entre onde termina a festa e onde começa o raio de acção da política cultural do actual executivo. O que foi divulgado, até à data, é manifestamente curto para uma cidade que se quer o terceiro pólo cultural do país. Ao fim de um ano, a completa ausência de uma linha condutora sobre esta temática é não só confrangedora, para uma urbe que se procura afirmar inter pares, como é reveladora da escassez de ideias que atravessa o actual executivo. Para que não restem dúvidas, património também é cultura, Sr.ª Vereadora.

Temos portanto, que ao nível de políticas culturais pouco há a registar, excepto talvez a adopção de um certo estilo “eco-pimba-urbano”, com laivos de uma tentativa de apropriação de conceitos preexistentes. Onde já vimos nós um Jardim no centro histórico? Será a imitação mais um sintoma que nos alerta para a total falta de rumo? Por um lado, será demasiado tarde para resgatar Ana Paula Santana do esquecimento? Por outro lado, será demasiado cedo para uma remodelação na vereação?

No entanto, este Natal, o executivo parece querer comunicar uma mudança, para tal deixa-nos maravilhados com o número de luzes LED. Sim, LED é a luz, do futuro, que vai encobrir, no presente, a total ausência de estratégia, conceito ou ideia de cultura.

Neste momento, no centro histórico, a pérola da cidade, o coração da acção é uma gigante tenda-cobertura plastificada onde as magnólias parecem encurraladas e asfixiadas para darem lugar a uma pseudo-estufa de estrelícias e palmeiras cujo habitat natural é tão tropical como a ideia de as cultivar no inverno beirão. Se a ideia pega, para o ano arriscamos a ver os confrades petizes vestidos de tupi-guaranis a levarem a cabo entronizações temáticas.

Fazer a diferença a todo o custo, sem um plano claro, não serve a cidade. Fazer diferente só porque sim demonstra a total neurose com a possibilidade que de uma noite de nevoeiro possa chegar, vindo de Bruxelas, o nosso D. Sebastião. E Viseu precisa de tudo menos de um executivo que dança ao som de um disco vindo do passado. Um executivo forte não tem medo do legado que assumiu, respeita-o, mas sabe trilhar o seu caminho sem cair no erro de atirar dinheiro e luz para cima do mau gosto na esperança de que dali surja algo de positivo.

Até quando estarão os viseenses dispostos a assistir do camarote a um gasto desnecessário dos seus recursos financeiros e do seu tempo em “manifestações culturais” de segunda na cidade que se quer “A terceira”?

Miguel Fernandes